Catarse

Doutorado em andamento em Filosofia (UERJ, 2018)
Mestre em Filosofia (UERJ, 2017)
Graduado em Filosofia (UERJ, 2015)

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Catarse é uma palavra grega (katharsis) utilizada tanto na medicina quanto na religião e na filosofia e que significa purificação, libertação ou purgação. Era utilizada no sentido da libertação do corpo ou da alma de algo que lhes era danoso, quer dizer, que os perturbava ou corrompia. Esse termo traz à memória dois poetas mitológicos gregos, Orfeu e Museu, segundo os quais a os adeptos das antigas religiões, quando ofereciam sacrifícios aos deuses, persuadiam os cidadãos de um determinado povo ou cidade a acreditar que através desses sacrifícios e de jogos agradáveis (como os das Olimpíadas) certas ações injustas podiam ser absolvidas e purificadas.

Em sentido estritamente filosófico, como tratado pelos antigos gregos, pode-se encontrar a reflexão sobre a catarse em dois filósofos. São eles Platão e Plotino. Para o primeiro, a catarse é a dissociação entre o melhor e o pior, onde o que é melhor é mantido e o que é pior, rejeitado. Desse modo, Platão aborda a catarse de duas maneiras, ligadas uma a outra: uma designando a libertação do ser humano em relação aos prazeres e a outra a libertação da alma em relação ao corpo. Quanto à purificação em relação aos prazeres, o filósofo afirma que só é possível a uma pessoa aproximar-se do conhecimento da verdade na medida em que se purifica do contato com o corpo e de tudo o que lhe é próprio, quer dizer, das sensações e dos prazeres. A purificação da alma em relação ao corpo acontece como um avanço da purificação em relação aos prazeres. É somente quando a alma está totalmente separada do corpo, o que só acontece na morte, que o conhecimento puro é possível.

Plotino, por sua vez, tratará da catarse insistindo especificamente na separação entre a alma e o corpo. Para este filósofo, que era um seguidor da doutrina platônica, são as virtudes o que purificam a alma de todas os desejos e emoções, separando, assim, a alma do corpo, fazendo com que a alma se recolha e se dedique a si mesma, não estando mais à mercê da influência do corpo.

Além desse sentido filosófico, a catarse também foi tratada em sentido estético, ligado às artes. O poeta grego Empédocles utilizou esta palavra como título de um de seus poemas, mas foi Aristóteles quem primeiramente desenvolveu um pensamento sobre ela nesse sentido. Em sua obra Poética, o filósofo escreve sobre uma espécie de libertação ou de serenidade que é provocada pela poesia e pela música, mas mais particularmente pelas antigas tragédias. Contudo, Aristóteles não desenvolveu mais profundamente o conceito, de modo que há duas interpretações possíveis sobre em que sentido ele poderia tê-lo aplicado. A primeira interpreta que a tragédia, através da purificação da catarse, teria um efeito moral, provocando uma moderação nos comportamentos humanos através do alívio de tensões e de certos impulsos destrutivos (violentos). A outra, mais simples, compreende que Aristóteles atribuía à tragédia um caráter simples que produzia diversão e relaxamento, sem qualquer relevância moral.

Já em outra obra, a Política, Aristóteles trata da catarse em seu caráter mais religioso, afirmando que algumas pessoas, fortemente abaladas por emoções como a piedade, o medo e mesmo o entusiasmo, podem encontrar a “cura” ao ouvir cantos sacros.

Para além de seu uso na antiguidade, a catarse continuou sendo tratada na modernidade e a reflexão a seu respeito segue até os dias atuais. A concepção que prevalece a seu respeito é a do escritor alemão Wolfgang von Goethe, para quem a catarse consistiria no equilíbrio das emoções provocado pela arte trágica. Hoje em dia, a catarse é quase exclusivamente associada à função libertadora da arte em geral.

REFERÊNCIAS:

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. Trad. Alfredo Bosi e Ivone Castilho Benedetti. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

BUNNIN, Nicholas; YU, Jiyuan. The Blackwell Dictionary of Western Philosophy. Oxford: Blackwell Publishing, 2004.

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