Substantivismo

Mestre em Filosofia (UFPR, 2013)
Bacharel em Filosofia (UFPR, 2010)

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Substantivismo é uma posição metafísica que afirma ser o espaço-tempo uma substância, tendo sua existência garantida independente da existência dos objetos e das relações entre tais objetos. É definido em oposição ao relacionismo, que afirma ser o espaço-tempo nada mais que um construto de relações.

Tais posições aparecem no contexto do debate acerca do estatuto ontológico do espaço-tempo, procurando responder questões como: O que é o tempo? O que é o espaço? Eles existem separadamente das coisas que afirmamos existirem neles ou só existem na medida em que as coisas existem?

De acordo com John Earman, a posição substantivista é caracterizada por defender que a existência do espaço-tempo deve ser entendida em termos de partes que se comportam como pontos, como uma linha, que embora seja continua pode ser entendida como uma série de pontos. Assim, interpretando as relações espaço-temporais entre eventos de acordo com a relação entre os pontos nos quais estes eventos ocorrem. Se compararmos a uma tela de pintura que tenha sido pintada em toda a sua extensão, podemos estabelecer relações entre pontos na pintura para nos referirmos a partes da tela. Esta abordagem só é possível se supormos que há uma tela sob a pintura e não que a própria pintura, tendo enriquecido, forma o que achamos ser uma tela.

Para ilustrar a questão, o filósofo alemão Leibniz, nos lança o seguinte experimento mental:

Se tudo no mundo fosse refletido do leste para o oeste, mantendo todas as relações entre os objetos, nós teríamos um mundo diferente?

Se o espaço-tempo é uma substância, a resposta é sim, teríamos um mundo diferente, pois os objetos estão em outra posição no espaço-tempo. Por outro lado, caso aceitemos que o espaço-tempo é nada mais que as relações entre os objetos, teremos de aceitar que o mundo continua o mesmo, afinal o espaço-tempo seria uma construção definida pelas relações e tais relações continuam as mesmas.

Um dos mais bem sucedidos experimentos trata da estabilidade da geometria em relação a uma região do espaço-tempo, permitindo-nos entender a influência deste debate na física. Como a Terra curva o espaço-tempo podemos fazer predições sobre quanto ela o curva, como ela arrasta o espaço-tempo e como a matéria se comporta nestas condições, mas se tirarmos a terra (e toda matéria na região que ela ocupa) só poderemos prever o comportamento do espaço-tempo a partir das regiões marginais, que tem matéria estabilizando a geometria. Isto é possível supondo que o espaço-tempo é um construto matemático, ou seja, que o substantivismo é falso, e assim sendo podemos dizer que o espaço-tempo se comporta em conformidade com as outras regiões.

Mas se o espaço-tempo é uma substância por si mesmo, como querem os substantivistas, não podemos prever como aquela região se comporta uma vez que não há matéria para estabelecer relações e assim estabilizar a geometria. Só poderíamos dizer como aquela região se comporta se tivéssemos acesso ao espaço-tempo em sí, mas o espaço-tempo, mesmo supondo que exista independentemente, é inverificável e por isso, sem admitir que ele é um construto que segue as mesmas regras construídas, não podemos prever seu comportamento.

Isto levou John Norton a afirmar que o substantivismo é uma inflação ontológica desnecessária, uma posição que postula entidades as quais não seriam necessárias para as teorias do espaço-tempo. Em defesa do substantivismo autores como Oliver Pooley apontam para a necessidade de uma realidade objetiva, afim de dar suporte às construções humanas, do contrário teríamos de supor que a própria realidade varia de acordo com os modelos que postulamos. Reunindo elementos de metafísica e física, o debate permanece ativo, na forma do substantivismo sofisticado.

Referências bibliográficas:
MACIEL, W. INDETERMINISMO, SUBSTANTIVISMO E O ARGUMENTO DO BURACO. UMA QUESTÃO ACERCA DO ESTATUTO ONTOLÓGICO DO ESPAÇO-TEMPO. Dissertação de mestrado. UFPR. 2013.

MACIEL, W. Substantivismo, determinismo e o debate acerca do estatuto ontológico do espaço-tempo. Principia (UFSC) , v. 11, p. 427-436, 2012.

Musser, G. Um buraco no coração da física. Scientific American Brasil. 2010.

Osvaldo Pessoa Jr.; Conceitos e Interpretações da Mecânica Quântica: o Teorema de Bell; Depto. de Filosofia, FFLCH, Universidade de São Paulo.

Pooley, Oliver. Special Relativity as a “Constructive” Theory. Oriel College, University of Oxford. 2004.

Rynasiewicz R. (1994), “The Lessons of the Hole Argument”, British Journal for the Philosophy of Science, 45: 407-436.

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