O ser humano é um animal político, cravou Aristóteles. Mas o que isso quer dizer, afinal? Diferentemente dos animais não-racionais, que vivem juntos em grupos, os homens e mulheres se unem de uma maneira mais complexa: eles formam uma sociedade. Ela é constituída por um conjunto de relações entre indivíduos, baseados em normas e regras explícitas ou implícitas. Essas regras, por sua vez, formam aquilo que chamamos de instituições, isto é, estruturas ou sistemas de ordenação social que regulam o comportamento das pessoas em suas vidas em comum. É o processo de tomada de conhecimento dessas regras, normas e estruturas que colocam as bases para a consciência política.
Mas tomar conhecimento das normas e regras que regulam nossa vida social não geram, por si só, uma reflexão sobre a natureza e a justificativa dessas ordens. É preciso um segundo passo, um momento onde se expõe esses princípios da organização social a uma avaliação crítica. Portanto, a consciência política é alcançada quando uma pessoa passa a compreender não só os padrões que definem a vida em comunidade, mas além disso, consegue entender os contextos históricos e às especificidades desses códigos de convivência em seus diferentes manifestações. É a partir desse exame entre normas seguidas e às circunstâncias nas quais essas normas se baseiam que a consciência individual evolui para a consciência política.
Assim, a tomada de consciência política pode ser entendida como um processo de desnaturalização da vida social. Isso porque, se no início do texto se falava da diferença entre animais racionais e não racionais, o que dá o tom político da vida em sociedade é o fato de que todas as regras e padrões estabelecidos não tem sua origem na natureza ou no determinismo, isto é, não podem ser entendidos como meras relações entre causas da natureza alheias à própria ação do homem. Pelo contrário, as regras sociais são criadas pelas próprias mulheres e homens que constituem a sociedade, e justamente por isso, não estão nunca finalizadas e cristalizadas, mas se encontram sempre abertas para o questionamento e para a sua eventual transformação.
A crítica dos padrões sociais pode apontar, de maneira muito esquemática, para duas posições em relação ao status quo, ou seja, ao estágio presente da sociedade: a primeira, manifesta numa postura conservadora, implica em tomar essas regras como justificadas, e que, portanto, não careceriam de alterações significativas. A segunda, caracterizada pela atitude progressista, consiste propriamente em tomar essas regras como injustas e, em nome da superação dessas injustiças, surgiria a necessidade de transformação delas. As diferentes ideologias políticas são então entendidas como o modo em que a consciência crítica tornou-se histórica e se cristalizou em diferentes programas e projetos para a sociedade.
Hoje em dia, como o amplo processo de informatização da opinião e os novos canais de informação e comunicação, faz-se mais necessário que nunca separar o que é a mera opinião frente aos fatos da consciência política de que tratamos nesse texto. Como afirmava o dramaturgo alemão Bertold Brecht, o pior tipo de analfabeto é o analfabeto político. Isso porque aquele que, por ignorância ou por vontade, abstém-se da política, não abre mão apenas de participar em prol de seus interesses particulares. Ele abre mão de sua autonomia e delega aos outros o poder de mandar sobre a sua própria vida.
Referência:
Bertold Brecht - O analfabeto político. Disponível em: https://revistaforum.com.br/noticias/119-anos-de-brecht-e-o-analfabeto-politico-continua-a-existir/
Texto originalmente publicado em https://www.infoescola.com/educacao/consciencia-politica/