Intuição e reflexão moral

Doutorado em andamento em Filosofia (UERJ, 2018)
Mestre em Filosofia (UERJ, 2017)
Graduado em Filosofia (UERJ, 2015)

Este artigo foi útil?
Considere fazer uma contribuição:


Ouça este artigo:

Em sentido geral, intuição e reflexão estão relacionados na medida em que cada um é uma operação do intelecto que diz respeito a alguma forma de conhecimento. Assim, a intuição, palavra que tem sua raiz no termo latino intueri, que significa “olhar para”, “olhar sobre” ou “inspecionar”, é um tipo de conhecimento imediato, ou seja, um conhecimento que é adquirido sem a necessidade de qualquer raciocínio lógico (mediação). Desse modo, a intuição é a compreensão de uma proposição, um conceito ou uma entidade sem a necessidade de experimentos externos, empíricos, ou internos, reflexivos. A reflexão, por outro lado, é o debruçar-se sobre as ideias, examiná-las, modifica-las ou combiná-las de diferentes maneiras, é o que adiciona ao espírito humano a informação a respeito de algo que foi experimentado, ela nos possibilita um conhecimento a partir da experiência. Nesse sentido, se o caso for analisado superficialmente, reflexão e intuição parecem ser radicalmente opostos. Contudo, a reflexão também pode operar sobre aquele conhecimento que é adquirido através da intuição e, assim, proporcionar uma melhor compreensão sobre aquele conhecimento intuitivo. Então, por exemplo, um dos conhecimentos que é atribuído à intuição é o conhecimento de Deus. Depois de adquirir intuitivamente o conhecimento de Deus, pode-se refletir a respeito deste conhecimento, sobre o que esse conhecimento significa, como nos relacionamos com ele, etc. É de maneia semelhante que podemos ver a relação entre intuição e reflexão no âmbito da moral.

O filósofo escocês Francis Hutcheson (1694 – 1745) afirmava que os julgamentos morais, quer dizer, o que determina se algo é moralmente bom ou ruim, eram produzidos no ser humano por uma faculdade da natureza humana que outro filósofo, Shaftesbury, denominou de sentido (ou senso) moral. Tanto Hutcheson quanto Shaftesbury acreditavam que cada ser humano possui naturalmente dentro de si tudo o que é necessário para tomar decisões morais e que possuem também uma natural inclinação para agirem de maneira moralmente correta.

O sentido moral, de acordo com Hutcheson, opera no indivíduo humano a partir de um natural instinto de benevolência, que faz produzir um sentimento de prazer no sentido moral do ser humano toda vez que ele é agente ou presencia alguma ação que seja boa ou benéfica para as outras pessoas, quer dizer, quando ele presencia uma ação que não é egoísta.

Esta capacidade humana de estabelecer julgamentos morais a partir do seu sentido moral, tal qual é apresentada por Hutcheson, pode ser enxergada como uma espécie de conhecimento moral intuitivo. Devido à natural benevolência dos seres humanos, cada indivíduo em particular é capaz de, intuitivamente, saber que tipos de ação são dignas de aprovação e quais são dignas de reprovação. Vê-se, portanto, que este conhecimento é tal que não demanda nenhuma espécie de reflexão ou experiência, sendo adquirido pela intuição.

Ainda no sentido proposto por Francis Hutcheson, a reflexão é um movimento posterior ao do sentido moral. Este sentido interior diz ao indivíduo, a respeito de questões morais, se ela deve ou não aprovar uma ação. A reflexão, por outro lado, fornece informação ao sentido moral, ela dá conteúdo a este sentido, de modo a informá-lo se algo é, de fato, bom para os outros e para o bem comum em geral. Uma reflexão moral, portanto, é uma reflexão que se debruça sobre o conteúdo moral adquirido pela intuição, de modo a examiná-lo, entende-lo, etc.

Esta concepção de intuição e reflexão moral é, naturalmente, uma das inúmeras formas em debate na filosofia a respeito do modo que um ser humano pode conhecer os valores morais. Pode-se dizer que a doutrina que se opõe à apreensão dos valores morais pela intuição é o ceticismo.

Referências:

AUDI, Robert. The Cambridge Dictionary of Philosophy. New York: Cambridge University Press, 1999.

BUNNIN, Nicholas; YU, Jiyuan. The Blackwell Dictionary of Western Philosophy. Oxford: Blackwell Publishing, 2004.

INTERNET ENCYCLOPEDIA OF PHILOSOPHY. Francis Hutcheson (1694 – 1745). Disponível em: https://www.iep.utm.edu/hutcheso/#SH3a. Acesso em: 31 de jan. 2020.

Arquivado em: Filosofia
Este artigo foi útil?
Considere fazer uma contribuição: