Origens da hermenêutica

Licenciatura Plena em Química (Universidade de Cruz Alta, 2004)
Mestrado em Química Inorgânica (Universidade Federal de Santa Maria, 2007)

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O conceito tradicional de hermenêutica (‘ερμηνευτική: ciência, arte) pretende indicar o “modo unitário de abordar, concentrar”, ou como indica Heidegger, “o acessar a ela, isto é, de questionar e explicar a faticidade”. Ele enfatiza que a etimologia da palavra hermenêutica é obscura, mas mediante algumas referências pode-se localizar o sentido originário do termo, tornando inteligível o modo como seu significado vai se transformando.

Palmer destaca que Heidegger atribuía significação moderna ao antigo uso dos termos gregos, vendo a própria filosofia enquanto interpretação, e estando relacionada a Hermes na sua função de transmutação, de transformar tudo aquilo que ultrapassa a compreensão humana em algo que a inteligência consiga compreender. Ele traz a “mensagem do destino” e hermenéuein (‘ερμηνεύειv) é esse “descobrir de algo, de qualquer coisa que traz uma mensagem, na medida em que o que se pode tornar-se mensagem” (PALMER, p. 24-25,1986)

Os gregos atribuíam ao deus-mensageiro-alado Hermes a descoberta da linguagem e da escrita, sendo estas as ferramentas para a compreensão humana, que as utiliza para chegar ao significado das coisas e para transmiti-los aos outros. Logo, “hermenêutica”, a partir da sua raiz mais antiga, sugere o processo de ser tornado compreensível, ser interpretado, e especialmente enquanto tal processo envolve a linguagem, visto ser a linguagem o meio por excelência neste processo. “A tarefa da interpretação deverá ser tornar algo que é pouco familiar, distante e obscuro em algo real, próximo e inteligível” (Das Verstehen, in HEIDEGGER, 2012).

Heidegger evidencia que Platão, no Teeteto (Θεαίτητος), dialogando sobre a natureza do conhecimento, aparece o confronto entre verdade e relativismo e o “logos (λόγος: discurso) corresponde à expressão de diferenças”. Neste contexto, notificar é tornar explicita a diferença de outros em relação ao comum (κοινόv). O que se vê nas palavras, e o que os intérpretes comunicam, não é uma concepção teórica, porém vontade, desejo e, além disso, ser, existência. Logo, a hermenêutica é a notificação do ser de um ente em seu ser em relação a outro ser, ao eu (HEIDEGGER, 2012).

Aristóteles, em De anima (Περί ψυχή), destaca que “o ente enquanto vivente necessita da língua para saborear como para conversar a respeito da lida com as coisas”. Neste contexto hermenéia (‘ερμηνεία) substitui a palavra dialeto (διάλεκτος), isto é, o falar coloquial a respeito disso ou daquilo. Neste, conforme Heidegger, “falar a respeito de algo, a fala faz com que o ente se manifeste se torne acessível em sua (não) serventia ou (in)utilidade, a fim de tê-lo em e à vista”. Enfatiza Aristóteles, em a Poética (Ποιητική), que “a linguagem do discurso é a interpretação através do pensamento”. Também, em Da interpretação (Περί ‘ερμηνείας), lógos (λόγος), na sua função fundamental, trata de descobrir e tornar conhecido o ente. A função associada da fala é tornar acessível algo enquanto tal, e o lógos têm a possibilidade assinalada de aléthéiein (άλήθεύειv: desocultar, colocar aí à vista, à disposição, o que antes estava oculto, encoberto) (PALMER, 1986).

Referências:
HEIDEGGER, Martin.  Ontologia – Hermenêutica da Faticidade. Petrópolis: Editora Vozes, 2012.

PALMER, Richard E. Hermenêutica. Lisboa: Edições 70, 1986.

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