Piracema

Mestre em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais (UFAC, 2015)
Graduada em Ciências Biológicas (UFAC, 2011)

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A palavra piracema tem origem do tupi e significa “subida do peixe”. Trata-se de um fenômeno anual, no qual diversas espécies de peixes ao redor mundo migram em direção à cabeceira dos rios em busca de locais mais adequados para a desova e alimentação de suas crias. A reprodução é uma fase essencial na vida dos peixes, pois permite que esses animais completem seu ciclo de vida, garantindo a perpetuação das espécies. Por isso a piracema é um processo extremamente importante.

De acordo com o comportamento reprodutivo, as espécies de peixes podem ser classificadas como sedentárias e migradoras. As espécies sedentárias podem completar todo o seu ciclo de vida em uma mesma área da bacia hidrográfica em que vivem. Mas as espécies migradoras, que realizam a piracema, precisam basicamente de dois ambientes: áreas de desova e áreas de crescimento e alimentação.

Piracema. Foto: Sekar B. / Shutterstock.com

A piracema coincide com o início do período de chuvas, quando o nível dos rios e as temperaturas da água e do ar aumentam. Nesse período a quantidade de alimentos disponíveis para os peixes aumenta, por causa dos itens alimentares que são levados aos leitos dos rios e lagos pela chuva, o que é fundamental para os peixes em migração. As águas mais turvas por causa das chuvas ajudam na proteção contra os predadores. No Brasil, o início da piracema varia de região para região, pois depende dos fatores climáticos, mas geralmente ocorre entre setembro e março.

Durante a migração, que é influenciada por fatores como luminosidade, temperatura, hidrologia e qualidade da água, os peixes nadam contra a correnteza, causando a queima da gordura acumulada no corpo. A distância percorrida varia entre as espécies e entre as bacias hidrográficas, sendo que uma mesma espécie pode percorrer distâncias diferentes dependendo da região, como o curimbatá, que percorre cerca de 450 km no rio Paraná e até cerca de 1 mil km no rio Mogi Guaçu. Essa espécie é considerada migradora de longas distâncias (acima de 100 km), assim como a piramutaba, dourado, dourada, mandi e o pintado. A dourada, por exemplo, percorre distâncias superiores a 4.000 km. Outras espécies, como o lambari, a tabarana e a maioria das espécies tropicais, realizam migrações curtas (até 100 km).

A migração tem um significado biológico, ela é necessária para estimular a produção de hormônios responsáveis pelo desenvolvimento das gônadas (ovários e testículos), maturação dos gametas e posterior desova. Ao superar os obstáculos, os peixes encontram locais favoráveis para desovar, geralmente lagoas marginais e alagadiços. No momento da fecundação, que é externa, as fêmeas liberam seus ovos na água, os machos depositam o sêmen e ocorre a fecundação. Os ovos fecundados eclodem em até 20 horas após a desova. Os ovos, as larvas e os peixes que já liberaram seus gametas descem os rios em direção às regiões mais inundadas da bacia. Os ovos podem permanecer para se desenvolverem nas lagoas marginais, conhecidas como berçários para peixes. As larvas que permanecem nas lagoas se tornam juvenis e precisam esperar até a próxima cheia para irem para o rio, já que durante a estiagem essas áreas ficam isoladas.

Os peixes formam grandes cardumes ao subirem os rios. Além disso, eles ficam extremamente cansados, e alguns pescadores se aproveitam desse momento para capturá-los com grande facilidade. A pesca é proibida por lei durante a piracema, mas as regras variam entres as regiões. Geralmente proíbe-se a pesca profissional, é permitida apenas a pesca de subsistência, mas restringem-se os meios de captura utilizados. Para os pescadores amadores limita-se a quantidade de peixes e fica proibida a pesca de espécies nativas da bacia. Essa proibição é fundamental para proteger as espécies e garantir a renovação dos estoques pesqueiros.

As barragens das usinas hidrelétricas também representam um obstáculo para os peixes da piracema. Ao tentarem subir o rio, os peixes se chocam contra a parede e morrem. As barragens também alteram os cursos dos rios, transformando ambientes lóticos em lênticos e alterando a rota migratória das espécies.

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Referências:

Hilsdorf, A. W. S.; Moreira, R. G. Piracema, por que os peixes migram? Scientific American Brasil, Mg, p.76-80, dez. 2008.

Leira, M. H. et al. Piracema: período de preservação dos peixes nativos. Nutritime Revista Eletrônica, on-line, Viçosa, v.15, n.03, p.8153-8163, 2018.

Arquivado em: Ecologia
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