Indianismo

Mestra em Letras e Linguística (UFG, 2016)
Licenciada em Letras-Português (UFG, 2009)

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Indianismo é o termo empregado para se refererir aos textos escritos com o propósito de divulgar os índios e a natureza exuberante do Brasil como elementos definidores da identidade nacional. Consiste em uma proposta artístico-literária que ganhou destaque no início do século XIX, sobretudo após a Proclamação da República, em 1822. Independente de Portugal, o país precisava promover o sentimento de patriotismo e resgatar, na América não colonizada, símbolos do caráter nacional, e encontraram na figura do índio o espírito do homem livre e incorruptível.

A origem do Indianismo

Para alguns estudiosos, o indianismo tem sua gênese associada ao folclore e aos gêneros de textos como mitos e lendas, contados pelos povos nativos do Brasil na tentativa de explicar a força e os fenômenos da natureza. Assim, o processo de colonização possibilitou a circulação de muitas dessas histórias, as quais acabaram ganhando atenção dos escritores, poetas que aqui viviam ou de estrangeiros que chegavam em expedições cintífico-culturais vindas da Europa.

Outros estudiosos sugerem que poetas árcades, no século XVIII, tenham sido os primeiros a trazerem à cena literária os povos nativos e as belezas naturais do Brasil, assim como fez o poeta mineiro Basílio da Gama (1741-1795), com a publicação de O Uraguai, em 1769. O poema épico tem 1.377 versos, divididos em cinco atos, e é baseado em fatos históricos ocorridos durante a Missão dos Sete Povos, período em que os missionários jesuítas catequisadores de índios tiveram problemas com relação às tribos locais e aos interesses por terras entre os colonos portugueses e os espanhóis. Outro poema épico, escrito no mesmo período, com aspectos indianistas, é Caramuru, do frei agostiniano José de Santa Rita Durão, em 1781. Nessa obra, o poeta relata cenas sobre o descobrimento da Bahia e também enfatiza as belezas naturais e a vida tranquila dos indígenas. Vale ressaltar que a visão do autor sobre a vida do indígena não correspondia à situação real de escravidão em que viviam.

Embora seja possível observar traços do Indianismo em obras de períodos distintos, o termo ganha força, enquanto movimento de expressão da cultura identitária nacional, na primeira geração romântica, no início do século XIX. Gonçalves de Magalhães é considerado o fundador do Romantismo no Brasil, com a publicação de Suspiros poéticos e saudades, em 1836. Para o poeta, escrever era como plantar a árvore da literatura brasileira, garantindo que ela frutificasse.

Vejamos a seguir as obras, autores e características do Indianismo brasileiro na poesia e na prosa.

A poesia indianista da primeira geração romântica

O projeto literário da primeira geração romântica tinha o propósito de fazer da literatura um instrumento de afirmação da identidade brasileira e de resgate da figura do índio e da natureza exuberante como símbolos de nacionalidade. Esse projeto foi declarado em 1836, nas páginas da revista Nitheroy, Revista Brasiliense de Ciências, Letras e Artes, organizada por Gonçalves de Magalhães e outros poetas. Mais tarde, as concepções indianistas foram divulgadas em outras revistas, como a Minerva Brasiliense (1843-1845) e Guanabara (1849-1856).

O grande nome da poesia romântica da primeira geração é Gonçalves Dias (1823-1864). Sua obra é de grande relevância à literatura brasileira. Nela o autor aborda temas como a natureza, a pátria e a religião. Alguns poemas indianistas de destaque são Os timbiras, Canto do piaga, Deprecação e I-Juca Pirama. Nesses poemas, o autor traz a selva intocada como cenário, onde acontecem caçadas, feitos de guerra, os quais corroboram com a imagem do índio heroico e nobre da nação brasileira. Leia a seguir um trecho de um poema:

O canto do guerreiro

I
Aqui na floresta
Dos ventos batida
Façanhas de bravos
Não geram escravos
Que estimem a vida
Sem guerra e lidar
– Ouvi-me, guerreiros
– Ouvi meu cantar.
II
Valente na guerra
Quem há, como eu sou?
Quem vibra o tacape
Com mais valentia?
Quem golpes daria
Fatais, como eu dou?
– Guerreiros, ouvi-me;
– Quem há, como eu sou? [...]

DIAS, Gonçalves. Poesia e prosa completas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1998. p. 106. (Fragmento).

No trecho, o guerreiro enumera seus feitos e pergunta: “quem há, como os brasileiros, descendentes de seres tão nobres?”.

Na poesia indianista, o índio sempre surge associado a virtudes como coragem e lealdade. Os versos indianistas não exploram a liberdade formal característica do Romantismo; os versos são marcados pelo controle da métrica e pela escolha das rimas. Uma estratégia para aproximar os leitores dos costumes indígenas era fazer com que o ritmo dos versos se assemelhasse ao toque dos tambores usados nos rituais indígenas.

O romance indianista

Na prosa, o projeto literário indianista foi muito influenciado por tendências europeias. Os escritores dedicaram-se à publicação de obras em que o passado histórico do país fosse reconstituído, quando possível, ou inventado, quando necessário. O índio é elevado à condição de herói representante do povo americano e se comporta de acordo com princípios nobres da sociedade burguesa: honestidade, bravura, paixão, humildade – tão valorizados pelos artistas românticos.

A apresentação dos protagonistas é associada às caracteríticas da natureza exuberante e ao passado glorioso que dignifica a identidade de seu povo. Os romances indianistas eram publicados em forma de folhetins e fizerem o gosto do público leitor. A linguagem empregada nos textos aproximou os leitores às tradições dos índios a partir de palavras e expressões de muitas línguas nativas dos povos indígenas brasileiros.

O romancista indianista de maior relevância da literatura brasileira é José de Alencar, com a publicação da trilogia O Guarani (1857), Iracema (1865) e Ubirajara (1874).

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