Reformas de Base

Mestre em História (UERJ, 2016)
Graduada em História (UERJ, 2014)

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As Reformas de Base eram um conjunto de medidas que objetivavam reestruturar as instituições políticas, jurídicas e econômicas do país. Pretendia-se, por meio dessas reformas, atenuar o quadro de desigualdade social do país, contudo, sem ultrapassar os marcos do liberalismo político e econômico. Entre as principais Reformas de Base estavam: a agrária, a administrativa, a constitucional, a eleitoral, a bancária, a tributária (ou fiscal) e a universitária (ou educacional).

Resumidamente, segue abaixo o que se pretendia realizar com cada uma dessas reformas:

  • Reforma Agrária: distribuição mais equitativa das propriedades rurais, desapropriando terras improdutivas; prioridade da produção agrícola que visasse o mercado interno;
  • Reforma Administrativa: a reestruturação da administração pública federal, para tal foram editadas leis para reorganização de materiais e do sistema de méritos, além da Lei Orgânica do Sistema Administrativo Federal;
  • Reforma Eleitoral: garantir o direito do voto aos militares de baixas patentes e aos analfabetos;
  • Reforma Bancária: controle da inflação por meio de um órgão central;
  • Reforma Tributária: modernização da arrecadação tributária para evitar fraudes fiscais;
  • Reforma Universitária: abolição da vitaliciedade de cátedra e a liberdade no exercício da docência;
  • Reforma Constitucional: a reforma constitucional era necessária para a viabilização das principais reformas como a agrária, a eleitoral e a universitária. (Cf. MENANDRO)

As Reformas de Base foram criadas durante o mandato presidencial de Juscelino Kubitschek (1956-1961) pelo partido do então vice-presidente da República, João Goulart. O Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) era, à época, presidido por Goulart e as Reformas de Base constituíram o programa do partido. Desse modo, as Reformas de Base foram a plataforma política da candidatura de João Goulart para reeleição à vice-presidência da República, em 1960, pleito do qual saiu vitorioso.

Já o candidato à presidência eleito, Jânio Quadros, era antípoda ao projeto político, herdeiro do varguismo, das Reformas de Base. Apesar de possuírem plataformas políticas opostas, Jânio Quadros e João Goulart compuseram o mesmo governo, pois os cargos de presidente e vice-presidente eram votados separadamente na época. Nesse ano da reeleição de Goulart (1961), entre os dias 5 e 17 de agosto, as Reformas de Base foram objeto de discussão política na Reunião Extraordinária do Conselho Interamericano Econômico e Social (CIES), realizada no Uruguai, em Punta Del Leste.

O governo de Jânio Quadros foi marcado por reveses e inconsistências políticas. O mesmo presidente que estabeleceu uma política cambial favorável aos negócios estadunidenses no Brasil, condecorou o revolucionário cubano Ernesto Che Guevara com a Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul. A instabilidade política do governo de Jânio Quadros levou-o à renúncia do cargo de presidente da República, em 25 de agosto de 1961. Assim, caberia ao vice-presidente João Goulart assumir o posto presidencial. No entanto, Goulart estava em missão diplomática na China, atrasando a tomada de posse.

No Brasil, os ministros militares do governo de Jânio Quadros (ministro da guerra general, Odílio Denis; da Marinha, vice-almirante Sílvio Heck; e da Aeronáutica, brigadeiro Gabriel Grün Moss) tentaram impedir que Goulart tomasse posse. Eles alegavam que as relações de Goulart com os países socialistas comprometeriam a segurança nacional. O Congresso Nacional não aceitou a proposta dos ministros militares de impedimento a Goulart, e votou a contraproposta da alteração do regime presidencialista para o parlamentarista. Em 7 de setembro de 1961, João Goulart foi empossado presidente em regime parlamentarista.

Como presidente da República, João Goulart encampou as Reformas de Base como programa político do mandato. E contou com o apoio de grupos de esquerda e nacionalistas favoráveis às reformas: sob a liderança de Leonel Brizola foi criada a Frente de Mobilização Popular (FMP) para a defesa das reformas, também corroboravam para a implantação das reformas a União Nacional dos Estudantes (UNE), o Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), o Pacto de Unidade e Ação (PUA) e a Frente Parlamentar Nacionalista (FPN). (Cf. Idem)

O encampamento das Reformas de Base tornou-se ainda mais efetivo quando após o plebiscito de 6 de janeiro de1963 o regime presidencialista voltou a vigorar. A maioria de votos para o regime presidencialista foi compreendida como endosso popular às Reformas de Base. Dessa maneira, a atuação do governo de João Goulart passou a ser mais incisiva na implantação das Reformas. Em 1963, Goulart enviou ao Congresso Nacional anteprojetos de reforma agrária e de reforma bancária. (Cf. Idem)

A Emenda nº 4 elaborada pelo PTB acerca da reforma agrária foi vetada pelo Congresso. A maioria no Congresso não se alinhava aos partidários das Reformas de Base, e a reforma que mais incomodava a esses parlamentares era justamente a Reforma Agrária. Devido a essa recusa à aprovação da Reforma Agrária, as demais reformas não conseguiam respaldo no Congresso. Por conta do rechaço da maioria dos congressistas, os grupos de apoio uniram-se ao poder Executivo para pressioná-los a validarem as reformas. A CGT ameaçava mobilizar uma greve geral em prol das reformas e de 70% do aumento dos salários de servidores públicos, e sargentos e suboficiais reivindicavam o direito ao voto, mesmo que para isso fosse necessário pegar em armas. (Cf. Idem)

Além de não assentirem as emendas necessárias às reformas, os congressistas também se recusavam a regulamentar a Lei de Remessa de Lucros que controlaria e limitaria o envio anual de lucros de empresas estrangeiras para o exterior. A Lei de Remessa de Lucros somente foi regulamentada em janeiro de 1964 pelo presidente. Em virtude da contrariedade do Congresso Nacional em ratificar as Reformas de Base, João Goulart planejou ir às ruas em Comícios de Base para arregimentar forças populares pela implantação das reformas.

Em 13 de março de 1964, foi realizado o Comício de Base em frente à Central do Brasil, no Rio de Janeiro, reunindo cerca de duzentas mil pessoas. Durante o Comício, Goulart anunciou a desapropriação de terras improdutivas e retomada de refinarias ao poder público. O Comício de Base e o comunicado do presidente impulsionaram as conspirações de setores conservadores e de direita que desencadearam o Golpe Militar de 1964.

Referências:

Brasil. Comissão Nacional da Verdade. Relatório/ Comissão Nacional da Verdade. Vol. 1. Brasília: CNV, 2014. p. 97; 681; 824. Disponível em: http://cnv.memoriasreveladas.gov.br/images/pdf/relatorio/volume_1_digital.pdf. Acessado em 18 de fevereiro de 2020 às 10h e 10m.

GASPARI, Elio. A ditadura envergonhada. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p. 47; 63.

MENANDRO. Heloísa. “Reformas de Base”. Disponível em: https://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/reformas-de-base. Acessado em 25 de fevereiro de 2020 às 12h e 44m.

Arquivado em: Brasil Republicano
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