Anos de chumbo

Mestre em Educação (UFMG, 2012)
Especialista em História e Culturas Políticas (UFMG, 2008)
Graduada em História (PUC-MG, 2007)

Este artigo foi útil?
Considere fazer uma contribuição:


Ouça este artigo:

Anos de chumbo é o nome dado ao período que vai da edição do AI-5, durante o governo de Costa e Silva, até o final do Governo Médici, considerado o mais violento de todo o regime militar.

As agitações de 1968 e a edição do AI-5

Durante o ano de 1968 o movimento estudantil ganhou as ruas em protesto contra a ditadura militar. O ponto alto de suas manifestações, entretanto, ocorreu um dia antes do aniversário de 4 anos do Golpe de 1964. Em uma manifestação no restaurante universitário do Calabouço, no Rio de Janeiro, um agente da Polícia Militar atirou contra o estudante secundarista Édson Luís de Lima Souto, causando grande comoção que culminou em passeatas pelas principais cidades do país. No dia 1º de Abril, novamente estudantes saíram em protesto contra a morte do jovem nas ruas do Rio de Janeiro, manifestação duramente reprimida que também culminou em morte e prisões.

Não bastasse aos militares as agitações estudantis de protesto contra a ditadura que se instalara no país há quatro anos, os movimentos de luta armada também cresciam – através de assaltos a bancos e ações de guerrilha rural – e as manifestações dos trabalhadores contra o arrocho salarial tomaram grandes proporções, como as Greves de Contagem e de Osasco.

A Igreja Católica, apesar de expressiva ala favorável ao governo militar, possuía integrantes que progressivamente passaram a reprovar os métodos dos agentes que feriam os direitos humanos. A Igreja em Roma passava por um momento de renovação e retorno ao trabalho com as classes mais pobres. Essa mudança foi entendida pelos militares como influência comunista que havia se infiltrado na Igreja e, com isso, diversos membros do clero foram também vítimas de torturas e prisões indevidas.

Mas foi um evento particular que retirou o AI-5 da gaveta e o colocou em prática. Após uma manifestação de reprovação quanto à invasão da Universidade de Brasília (UNB), no contexto dos protestos estudantis, feita pelo deputado Márcio Moreira Alves, os militares tentaram suspender a imunidade parlamentar do deputado, pedido negado corajosamente pelo Congresso Nacional em 12 de dezembro de 1968. No dia seguinte, Costa e Silva editou o AI-5, dando plenos poderes ao Executivo para cassar direitos políticos e mandatos, além de suspender o direito a habeas corpus e decretar o recesso do Congresso.

Ufanismo e milagre econômico

O Governo Médici herdou o AI-5 e não apenas ele. Também gozou de um crescimento de cerca de 10% ao ano, o chamado “milagre econômico”. Nesse mesmo contexto, uma série de propagandas ufanistas tentavam superar os gritos da oposição e reafirmar que o Brasil estava unido e tinha orgulho de quem era. “Brasil: ame-o ou deixe-o” foi um dos slogans do período e uma clara mensagem aos oponentes do governo militar.

Para contribuir ainda mais para o mascaramento dos problemas sociais e da insatisfação de diversos grupos quanto à ditadura, a Copa de 1970, em que o Brasil tornou-se a primeira seleção a ser tricampeã, foi também utilizada como propaganda política de que o Brasil ia bem, apesar do povo ir mal, conforme o próprio Médici afirmou.

Torturas, mortes e desaparecimentos forçados

Os anos de chumbo deixaram não apenas uma grande dívida para os governos seguintes, mas também um saldo de mortes mal explicadas e desaparecimentos forçados. Exemplos são a morte de Carlos Marighella, fundador da Aliança Libertadora Nacional (ALN) e uma lista que foi elaborada pela Comissão Nacional da Verdade (CNV) com 434 nomes, sabendo que certamente o número é maior.

Utilizando diversos métodos de tortura, os militares jogaram nos porões dos DOPS e dos DOI-CODI estudantes, jornalistas, intelectuais, artistas, militantes, políticos, professores universitários e até mesmo membros do clero sob a alegação de conter o avanço do comunismo no país. Em nome da segurança nacional, mancharam de vermelho a história da ditadura militar, mancha essa ainda presente na memória das famílias que perderam seus entes de forma tão estarrecedora.

Bibliografia:

BUENO, Eduardo. Os anos de chumbo. In: Brasil: uma História: cinco séculos de um país em construção. Rio de Janeiro: Leya, 2012, p. 402-417.

LIMA, Wilson. Comissão da Verdade confirma 434 mortes e desaparecimentos na ditadura. Último Segundo, iG, Brasília, 10 dez. 2014. Disponível em: <http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2014-12-10/comissao-da-verdade-confirma-434-mortes-e-desaparecimentos-na-ditadura.html>. Acesso em: 7 nov. 2017.

PAES, Maria Helena Simões. Em nome da Segurança Nacional: do golpe de 64 ao início da abertura. São Paulo: Atual, 1995.

SCHWARCZ, Lilia M.; STARLING, Heloisa M. No fio da navalha: ditadura, oposição e resistência. In: Brasil: uma biografia. São Paulo: Cia das Letras, 2015, p. 437-466.

Arquivado em: Ditadura Militar
Este artigo foi útil?
Considere fazer uma contribuição: