Discinesia Ciliar Primária

Graduada em Medicina Veterinária (UFMS, 2009)

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A discinesia ciliar primária (DCP), anteriormente conhecida como síndrome dos cílios imóveis, faz parte de um pequeno grupo de desordens genéticas, de herança autossômica recessiva, que caracteriza-se por causar defeitos ultra-estruturais e/ou da função ciliar, resultando em alterações do transporte muco-ciliar. Este, por sua vez, é um importante mecanismo de defesa do trato respiratório, carregando em direção à orofaringe agentes invasores, como bactérias, vírus, alérgenos e poluentes. Quando esse transporte é interrompido, há o surgimento da doença clínica.

O estudo dessa afecção iniciou-se há aproximadamente um século, por meio da observação clínica de síndromes que englobavam doenças pulmonares, sinusopatia, situs inversus (inversão dos órgãos internos) e infertilidade masculina. No ano de 1904, Siwet foi quem primeiro relatou a ocorrência do situs inversos e da bronquiectasia. Já em 1933, Kartagener, estudou com maiores detalhes pacientes com sinusite, bronquiectasia e situs inversus, levantando a possibilidade de haver uma patogênese comum. Essa tríade recebeu o nome de síndrome de Kartagener.

Posteriormente, defeitos encontrados na ultra-estrutura ciliar foram relacionados a defeitos ultra-estruturais da cauda dos espermatozóides de homens inférteis com afecções pulmonares, sendo proposto por Afzelius o nome síndrome dos cílios imóveis. Contudo, no ano de 1980, Sleigh propôs o nome discinesia ciliar primária, pois observou que, na realidade, não se tratar de uma imobilidade dos cílios, mas sim de movimentos incoordenados ou discinéticos por parte destes.

O defeito mais comumente encontrado é uma alteração do número de braços de dineína (proteína motora), levando ao enfraquecimento dos cílios do trato respiratório e na mobilidade espermática. Mas também pode ocorrer devido a:

  • Defeitos nas espículas radiais, o que leva à desorientação do centro do cílio, resultando em um posicionamento excêntrico dos microtúbulos centrais;
  • Mudança dos microtúbulos periférios para uma posição central;
  • Ausência das estruturas do axonema;
  • Microtúbulos duplos supranumerários;
  • Problema no aparelho basal.

Esta afecção acomete todas as partes do corpo onde é encontrado epitélio ciliado, como fossas nasais, seios paranasais, ouvido médio, árvore traqueobrônquica, epêndima, condutos eferentes, tuba uterina, endométrio do cérvix e nos prolongamentos das células da retina.

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Sintomas

Nos primeiros anos de vida, as áreas mais acometidas são o ouvido médio e o trato respiratório superior. As manifestações clínicas vão desde rinorréia leve a sinusite e otite média de repetição, sendo estes sintomas normalmente recorrentes. Ao passo a afecção progride, aparecem os sinais clínicos de acometimento do trato respiratório inferior e o surgimento de complicações como bronquiectasias, hipocratismo digital e déficit de crescimento. A clássica tríade que constitui a síndrome de Kartagener (sinusopatia, bronquiectasia e situs inversus) encontra-se presente em, aproximadamente, metade dos pacientes.

Nos adultos, a DCP pode manifestar-se como tosse produtiva, sinusopatia crônica e otite média, mesmo que o situs inversus não esteja presente. Infertilidade nos homens pode ser a maior queixa, mesmo na ausência de sintomas respiratórios.

Diagnóstico

A suspeita clínica se dá por meio do histórico clínico do paciente. Alguns exames com valor presuntivo podem ser feitos, como o teste de sacarina, que avalia indiretamente oclearence muco-ciliar; a dosagem de óxido nítrico exalado, que apresenta-se com níveis baixos; e a frequência do batimento ciliar, que encontra-se diminuído quando observado a microscopia óptica em material obtido de biópsia nasal.

Exames radiográficos do tórax mostram diferentes graus de envolvimento pulmonar, com espessamento de paredes brônquicas, hiperinsulação, podendo apresentar bronquiectasias, atelectasias, condensação, situs inversus. Radiografias da face revelam espessamento mucoso ou opacidade dos seios paranasais. Tomografia computadorizada do tórax também pode ser feita para melhor avaliação de bronquiectasias e atelectasias segmentares. O diagnóstico confirmatório é feito por meio do estudo da ultra-estrutura, da orientação e da função ciliar.

O diagnóstico diferencial deve ser feito com doenças que podem apresentar sintomatologias semelhantes ao da DPC, como fibrose cística, imunodeficiências, deficiência de α-1-antitripsina, asma, aspiração crônica e bronquiectasias que apresentam outras etiologias.

Tratamento

Ainda não existe um tratamento específico para reparar a DCP. A fisioterapia respiratória gera resultados positivos para pacientes com esta doença, por promover a remoção de secreções. A realização de inalação com soro fisiológico mucolíticos ou broncodilatadores deve preceder à fisioterapia respiratória. Antitussígenos não devem ser usados em hipótese nenhuma.

A adoção de medidas profiláticas também é importante, como imunização contra hemófilo, pneumococo e influenza, bem como o controle do ambiente físico, com prevenção da exposição ao tabaco, poluentes e alérgenos ambientais. Uma boa hidratação auxilia na manutenção da fluidez das secreções, tornando assim, mais fácil a sua eliminação.

O uso de antibióticos é indicado em casos de infecções. Recomenda-se realizar uma cultura do escarro desses pacientes, para monitorar a flora bacteriana presente em seu trato respiratório, facilitando assim, a escolha do antibiótico adequado.

Fontes:
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1806-37132007000500017&script=sci_arttext
http://www.uptodate.com/contents/primary-ciliary-dyskinesia-immotile-cilia-syndrome
http://en.wikipedia.org/wiki/Primary_ciliary_dyskinesia
http://www.scielo.br/pdf/jpneu/v27n5/a06v27n5.pdf
https://web.archive.org/web/20180721121335/http://www.jped.com.br/conteudo/00-76-01-09/port.pdf

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Arquivado em: Doenças genéticas
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