Romance

Doutorado em Letras - Literatura e Língua Portuguesa (PUC-Rio, 2013)
Mestrado em Linguística, Letras e Artes (PUC-Rio, 2008)
Graduação em Jornalismo (PUC-Rio, 2001)

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O romance é um gênero literário surgido no início do século XVII, tendo como um de seus principais atributos a hibridez, manifestada na combinação de gêneros (novelas, cartas, narrativas de viagem), estilos e linguagens.

O discurso romanesco é composto por unidades estilísticas, ente as quais podemos destacar:

  • Estilização de diversas formas da narrativa tradicional oral.
  • Estilizações de diversas formas de narrativa.
  • Variação de formas literárias.
  • Discursos de personagens estilisticamente individualizados.

Tais unidades formam um sistema literário harmonioso, de modo que a combinação das mesmas, sem subordinação a uma única estrutura, dá forma ao gênero. Assim, apesar de ser considerado um discurso poético, não cabe na definição oficial utilizada pela estilística, baseada nas concepções de Aristóteles, que exclui uma série de gêneros, como o satírico, na medida em que os caracteriza como não oficiais.

A obra considerada precursora do gênero é Dom Quixote, do espanhol Miguel de Cervantes, que viria a definir os rumos da prosa europeia e mundial nos séculos posteriores a seu lançamento. Segundo o teórico russo Mikhail Bakhtin, o livro consiste no “modelo clássico e mais puro do gênero romanesco (...), que realizou com profundidade e amplitude excepcionais todas as possibilidades literárias do discurso romanesco plurilíngue e internamente dialogizado” (1988: 27).

Além de Bakhtin, o filósofo Michel Foucault também salienta a importância da obra, representante de um momento na evolução do pensamento humano, no qual as narrativas ficcionais exercerão um novo papel. De acordo com Foucault, o homem do século XVII passa a perceber a realidade e a constituição do mundo exterior de forma fragmentada, descontínua, instável. Liberta dos resquícios medievais e renascentistas, a arte perde a sua função de decifradora dos enigmas universais para se afirmar como pura representação. Tal movimento também se observa no campo das artes plásticas, com o quadro Las Meninas, de Velásquez.

Dois séculos depois, com a Revolução Industrial e a ascensão definitiva da burguesia ao poder na política, o romance atinge seu ápice de popularidade como objeto de entretenimento para o público consumidor recém-formado e crescente, o que o caracteriza como um gênero predominantemente popular. Publicado, em geral, de forma seriada (em capítulos) nos jornais da época, o romance representava um papel equivalente ao das telenovelas contemporâneas, tendo perdido uma parcela considerável do público com o surgimento do rádio e, posteriormente, da televisão, veículos que incorporaram as narrativas dramáticas à sua programação diária.

Entre as principais características do romance burguês, pode-se salientar do surgimento do herói problemático, que consiste no indivíduo que se debate na busca de sentido para a própria existência. Além disso, chama a atenção o recorrente uso de recursos como paródia, da intertextualidade e do perspectivismo, que auxiliam na caracterização do gênero como misto e impuro.

Em relação aos autores da época, destacam-se os franceses Honoré de Balzac (A Comédia Humana) e Emile Zola (O Germinal), o britânico Charles Dickens (David Copperfield, Oliver Twist), o norte-americano Mark Twain (Tom Sawyer, Huckleberry Finn), os russos Leon Tolstói (Guerra e Paz, Anna Karenina) e Fiódor Dostoiévski (Crime e Castigo, Os Irmãos Karamázov), e o brasileiro Machado de Assis (Dom Casmurro, Memórias Póstumas de Brás Cubas).

O século seguinte também testemunhou o surgimento de grandes romancistas, tais como o francês Marcel Proust (Em Busca do Tempo Perdido), o irlandês James Joyce (Ulisses, Finnegans Wake), o português José Saramago (O Evangelho Segundo Jesus Cristo), o brasileiro Guimarães Rosa (Grande Sertão: Veredas, Sagarana), e o colombiano Gabriel García-Márquez (Cem Anos de Solidão).

Leia mais:

Referências:

BAHKTIN, M. Problemas da Poética de Dostoíévski. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005.

_____________. A Teoria de Romance. São Paulo: Unesp, 1988.

CALVINO, I. Por que ler os clássicos? São Paulo: Companhia das Letras, 1993.

CERVANTES, M. de S. Dom Quixote de La Mancha. São Paulo: Abril Cultural, 1978.

FOUCAULT, M. As Palavras e as Coisas. São Paulo: Marins Fontes, 1999.

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